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terça-feira, 2 de novembro de 2010

Liberdade


          Segundo o dicionário Aurélio, liberdade é a faculdade que cada um tem de se decidir ou de agir de acordo com a própria determinação, desde que esteja dentro dos limites impostos por normas definidas. Liberdade é independência, autonomia; é o “estado ou condição de homem livre”. E algumas definições para “Livre” se mostram em o “que não está prisioneiro; solto; desembaraçado; desobrigado; desimpedido; espontâneo, natural; imenso, infinito”. Desse modo, para mim especificamente, liberdade é não ter nada que me impeça de seguir em frente, especialmente quando eu sei que é lá que está o que Deus quer me dar.
          Eu sempre tive muita facilidade pra expressar o que eu sinto, e, ao mesmo tempo, muita dificuldade. Isso porque expressar sentimentos exige que os transformemos em pensamentos que nem sempre são claros... E os pensamentos precisam ser traduzidos em palavras, escritas ou faladas, cuja eficiência nem sempre corresponde à necessidade real de expressão. Às vezes as palavras não são capazes de exprimir sentimentos que muitas vezes nem nós mesmos conseguimos entender.  Mas não é só essa a dificuldade no momento da expressão, porque a pessoa para a qual você se expressa é peça chave para determinar a qualidade da sua comunicação, podendo te libertar ou te escravizar. Se você escolher qualquer pessoa, ou muitas pessoas, pessoas erradas, pessoas más, pessoas impacientes ou incompreensivas, fofoqueiras ou indiferentes, você pode se tornar um escravo das próprias palavras que você soltou. Mas se você aprender a guardar sua expressão para a hora certa e para a pessoa certa, a expressão pode ser um ato libertador.
          Por muito tempo eu tive o péssimo hábito de não me importar com meus próprios sentimentos/pensamentos/segredos, e simplesmente saía contando tudo pra todo mundo, acreditando que ninguém me entenderia mal, ou que as pessoas eram tão sinceras e honestas quanto eu, ou pensando que o fato de eu falar o que eu sentia iria contribuir para que as pessoas me entendessem e talvez gostassem tanto de mim quanto eu delas. É óbvio que é exatamente pra este fim que serve a comunicação, para que as pessoas nos entendam e desse modo o convívio melhore a cada vez... Mas a grande questão é aprender que existe muita gente, muuuitaaa gente mesmooo, que não tá nem aí pra você e sequer merece imaginar o que você tem a compartilhar. Isso eu demorei a conseguir, mas quando aprendi o que é decepção, fui pro outro extremo e me tranquei. Passei a evitar expressar-me, guardei quase tudo pra mim... e detestei isso. Até que finalmente comecei a detectar as raras e boas pessoas com as quais eu posso contar, as quais têm o direito de me compreender... E, agora que estou aprendendo o que é ter equilíbrio, resolvi tentar de novo.
          Então ontem tive uma das conversas mais importantes da minha vida: Libertei alguns pensamentos que estavam presos lá dentro do meu baú mental de segredos e os compartilhei com uma das pessoas mais significativas pra mim. Meu coração se abriu como há tempos eu não fazia, e eu deixei as palavras fluírem sem medo, exatamente como eu amava fazer... E isso foi estranhamente incrível... De certa forma foi bem natural pra mim, ainda mais porque a pessoa certa estava ali quando a hora certa aconteceu. O que eu senti durante e depois daquele momento foi que eu estava crescendo, que eu estava abrindo as asas e começando a bater devagar... Começando a entender o que é ser livre de verdade... Mas o grande problema é que eu descobri que às vezes a liberdade real é algo doloroso de viver.
          Quando guardamos algo especial pra nós trancado dentro do peito, tentamos guardar algo como um tesouro escondido, algo como uma bússola, ou até um amuleto de segurança.  Mas ao expressar meus estranhos sentimentos e pensamentos em forma de palavras faladas diretamente para a pessoa mais conveniente, eu estava abrindo mão da minha corda de resgate, eu estava abandonando meu bote salva-vidas, porque depois daquilo eu senti que nunca mais eu os teria pra agarrar quando eu precisasse, senti que eu estava me soltando de algo que me sustentava na hora da minha maior fraqueza, o que momentaneamente pode ser algo profundamente aterrorizante.
          Só que o problema é que o ser humano tem grande dificuldade de enxergar que alguns tesouros escondidos são, na verdade, lâminas de altíssima eficiência, peças fabricadas para serem mortais ao tocarem a moleza do próprio coração; a bússola é, na verdade, uma lança bem pontuda e afiada e o amuleto é uma erva venenosa que faz definhar bem devagar aquele que se agarra nela... O ser humano sofre muito antes de perceber que não precisa mais da corda, nem do bote, porque demora a se tocar de que a hora de pisar em terra firme chegou, e ele pode começar a viver livremente de novo. Demoramos a perceber que existe algo estável e firme sobre o qual podemos por os pés, um horizonte muito maior pela frente do que o que antes tentávamos agarrar com as mãos. A dor está, portanto, no processo interior de compreender os próprios fatos.
          Hoje não digo que tudo que sentimos ou pensamos deve ser aberto ao conhecimento de toda e qualquer pessoa, mas digo que não devemos ter amuletos que nos consomem por dentro. As coisas que guardamos pra nós mesmos devem ser especiais, sim, mas não devem nos sufocar ou nos cegar, nos impedir de progredir. Também não digo que pra nos libertarmos dessas “cordas” devemos simplesmente jogar as palavras ao vento, mas digo que temos que procurar conhecer a hora e as pessoas certas para cada expressão desses sentimentos ou pensamentos. O que eu experimentei, e de fato funcionou, é pedir a Deus que me ajude a identificar as pessoas em quem posso confiar e, se já sei, que me ajude a enxergar o grau da necessidade e aproveitar a oportunidade certa. A conversa certa com a pessoa certa quando a hora surge pode ser restaurador, surpreendente e aliviante se a gente não deixar passar. Assim como as palavras ditas sem sabedoria podem ser (auto)destruidoras, do mesmo modo pode ser o esconderijo eterno de algumas delas.
          Agora eu sei que não é uma delícia imediata todas as vezes que me expresso, pois há vezes em que a libertação de palavras é desestabilizador, mesmo no momento certo e com a pessoa certa. Mas hoje eu entendo que se eu quero ser livre de amuletos, livre de cordas, independente de botes ou bússolas, se eu quero saber o que há pela frente ou voar mais alto, é necessário passar pela dor do desprendimento do que pesa dentro do coração.
          Agora pode ser meio apavorante não saber o que vou fazer sem meus tesouros em forma de sonhos distorcidos... Mas se eu preciso abandoná-los para poder conhecer os horizontes que Deus fez pra eu alcançar no futuro, então que doa. Foi o que eu fiz ontem, quando decidi me expressar para a única pessoa no mundo que poderia compreender da melhor forma possível tudo o que eu tinha guardado só pra mim. Creio que foi uma das decisões mais importantes que eu já tomei e sou grata a Deus por estar comigo sendo a rocha firme na qual eu agora posso pisar.
          Creio que se tenho tido boa sorte é por causa Dele, que me ensinou que o amor liberta. Não preciso ser tomada pelo medo, porque Nele eu posso confiar. Nele me agarro sabendo que não vai me soltar. Nele me apego sabendo que não vai me envenenar. Com Ele não preciso de bússola, porque Ele segurou minha mão e conhece tudo, além de enxergar infinitamente mais longe que eu. Com Ele não preciso de bote, porque meu navio não vai afundar, nem preciso de corda, porque Ele me ensina a nadar e até a voar. Com Ele não estou mais sozinha, mesmo que o mundo se exploda ao redor. Com Ele tenho esperança, Nele encontro descanso, equilíbrio, conforto e paz. Respiro fundo e decido, então, ir em frente, mesmo que antes de poder rir eu precise chorar um pouquinho... =)
          Que Deus te permita viver essa liberdade, essa real liberdade que só Nele alguém pode encontrar, e eu encontrei.
          Beijos,
          Lu Grando.